terça-feira, 15 de abril de 2008

QUARENTA COISAS

PARA O SEU FILHO FAZER ANTES DOS SETE ANOS

1. Brincar, brincar, brincar
2. Acampar na sala com você
3. Ter segredos gostosos com o pai e com a mãe, separadamente
4. Tomar banho de esguicho na grama em dia de sol ou correr e brincar na chuva
5. Plantar uma árvore ou um pezinho de feijão no algodão, dá na mesma
6. Fazer biscoito, bolo, comida, se sujando e sujando a cozinha toda. Depois, comer aquela gororoba e ter dor de barriga
7. E ganhar colinho. Ganhar colinho sempre, mesmo quando o colo fica pequeno. Aliás, existe colo pequeno? Que conversa estranha... Colo é colo!
8. Ter uma festa de aniversário legal – isso não tem nada a ver com gastar dinheiro e, sim, com reunir a família, comemorar e estar feliz
9. Esperar o coelho da Páscoa. E ver as pegadas dele no chão
10. Viajar "sozinho" – com os amigos, a escola, o acampamento
11. Esperar Papai Noel chegar. E entender que aquele presente escondido no armário dos pais é outra coisa, nada a ver com Papai Noel
12. Fazer misturinha. Sabe o que é? É poder, quando ir ao restaurante, misturar no copo de água tudo que aparecer na mesa: a bebida dos outros, açúcar, sal, pimenta, azeite, farelo de pão
13. Ir para a escola, ser alfabetizado
14. Ficar deitado na grama vendo estrelas e o desenho das nuvens
15. Escrever na parede – e levar bronca. Faz parte, mas uma coisa não invalida a outra
16. Aprender a amarrar o tênis. E se sentir importante por causa disso
17. Sentir-se importante. Porque, de fato, é
18. Inventar história. Em todos os sentidos. Inventar
19. Aprender a comer o básico. Porque o básico é básico
20. Dormir bem e na hora. Em silêncio, limpinho, na própria cama
21. Ir dormir tarde de vez em quando, porque é uma delícia
22. Dormir na cama da mãe e do pai e fazer farra ou esticar a preguiça
23. Faltar na aula sem motivo, num dia de chuva, por exemplo, e ficar em casa de pijama, brincando
24. Ir à escola e aprender. Aprender até que faltar na aula é um prejuízo danado
25. Fazer uma viagem pra longe. Acampar. Pantanal. Mudar de ambiente. Sonhar, delirar
26. Descobrir que voltar pra casa é muito bom. E que nossa casa é um mundo, o universo
27. Aprender a nadar, andar de bicicleta, ficar em pé no balanço
28. Ter tido, estar pensando em ter ou ter freqüentado uma casinha na árvore. Vale só desejar, também. Aliás, desejar é muito bom, sempre. Motiva
29. Ter ido a um concerto ou a um balé clássico ou uma ópera. E a um show de rock e a muitas e muitas e muitas peças infantis
30. Fazer um espetáculo. Aquele de balé, do final do ano. Aquele da escola. Um show com os amigos, improvisado. Valem todos
31. Ter coleção. De revista, de figurinha, de meleca, de mosquito morto, de minhoca, de carrinho, o que for
32. Fazer besteira e não contar pra ninguém
33. Dormir na casa dos avós, curtir com os avós, aproveitar os avós
34. Ter medo e correr pro colo do pai e da mãe. E descobrir que, assim, o medo passa
35. Jogar bolinha de gude, soltar pipa, brincar de esconde-esconde ou pique
36. Cantar, ligar o radio bem alto
37. Ter um amigão ou amigona de verdade, não invisível
38. Ter falado o que gosta, ouvido o que não gosta, respondido o que não devia e pedido desculpa
39. Ter conversado muito, muito, com o anjo da guarda
40. Ter sido criança. Todos os dias. Aproveitando isso. Sem ninguém atrapalhar.

quinta-feira, 3 de abril de 2008

A GARDÊNIA BRANCA

Marsha Arons

Todos os anos, no dia do meu aniversário, desde que completei doze anos, uma gardênia banca me era entregue anonimamente em casa. Não havia nunca um cartão ou um bilhete e os telefonemas para o florista eram em vão, pois a compra era sempre feita em dinheiro vivo. Depois de algum tempo, parei de tentar descobrir a identidade do remetente. Apenas me deleitava com a leveza e o perfume estonteante daquela única flor, mágica e perfeita, alinhada em camadas de papel de seda cor-de-rosa.

Porém nunca parei de imaginar quem poderia ser o remetente. Alguns de meus momentos mais felizes eram passados sonhando acordada com alguém maravilhoso e excitante, mas tímido ou excêntrico demais para revelar sua identidade. Durante a adolescência foi divertido especular que o remetente seria um garoto por quem eu estivesse apaixonada, ou mesmo alguém que eu não conhecia e que havia me notado.

Minha mãe freqüentemente alimentava as minhas especulações. Ela me perguntava se havia alguém a quem eu tivesse feito uma gentileza especial e que poderia estar demonstrando anonimamente seu apreço.

Minha mãe fez o que pôde para estimular minha imaginação a respeito da gardênia. Ela queria que seus filhos fossem criativos. Também queria que nos sentíssemos amados e queridos, não apenas por ela, mas pelo mundo como um todo.

Quando estava com dezessete anos, um rapaz partiu meu coração. Na noite em que me ligou pela última vez, chorei até pegar no sono. Quando acordei pela manhã, havia uma mensagem escrita com batom vermelho em meu espelho: “Alegre-se, quando semideuses se vão, os deuses vêm.” Pensei a respeito daquela citação de Emerson durante muito tempo e a deixei onde minha mãe a havia escrito até meu coração sarar. Quando finalmente fui buscar o limpa-vidros, minha mãe soube que estava tudo bem novamente.

Mas houve certas feridas que minha mãe não pôde curar. Um mês antes de minha formatura no segundo grau, meu pai morreu subitamente de enfarte. Meus sentimentos variavam de dor a abandono, medo, desconfiança e raiva avassaladora por meu pai estar perdendo alguns dos acontecimentos mais importantes da minha vida. Perdi totalmente o interesse em minha formatura que se aproximava.

Na véspera do baile, encontrei o vestido que escolhera com meu pai – pelo qual havia perdido totalmente o interesse – esperando por mim. Eu podia não me importar em ter um vestido novo, mas minha mãe sim. Ela estava atenta à imagem que seus filhos tinham de si mesmo.

Inibiu-nos com uma sensação de mágica no mundo e nos deu a habilidade de ver a beleza mesmo em meio à adversidade. Na verdade, minha mãe queria que seus filhos se vissem como a gardênia – graciosos, fortes, perfeitos, com uma aura de mágica e talvez um pouco de mistério.

Minha mãe morreu quando eu estava com vinte e dois anos, apenas dez dias depois do meu casamento. Esse foi o ano em que parei de receber as gardênias.